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Agulhas – Alexandria, epílogo 3: Gondar e Lalibela

8 minutos

Addis Abeba, Etiópia (06/11/2015), véspera da partida para Cape Town.

Foi uma longa missão convencer os oficiais da alfândega que as peças eram para o meu veículo e não para contrabando. Após 3 horas de intensa discussão, exausto, fui direto para meu hotel descansar. Desde o momento em que recebi as peças na Catania, vindas de Liverpool, elas passaram por Istambul, Alexandria, Cairo, Addis Abeba e Cape Town. Chegava a hora das viajadas peças encontrarem o seu destino.

Acordei cedo e entusiasmado para o esperado reencontro com “The Hero”. Ao chegar na Embaixada, fui surpreendido com a calorosa recepção dos funcionários brasileiros e etíopes, cientes do meu retorno. Retirei a capa do meu velho amigo, reconectei a bateria e dei a partida. Nada. Não era a bateria, talvez um galão de diesel mais fresco ajude. Fui a pé até o posto, voltei, abasteci, dei a partida e como sempre, o herói não me deixou na mão: após 4 meses de descanso, estava novamente pronto para seguir em frente.

Após agradecer toda a equipe da Embaixada, seguimos direto à oficina, do outro lado de Addis e sob o trânsito caótico já esperado. Na oficina, já era um velho conhecido. Entreguei todas as peças solicitadas, checando uma por uma. Repassamos todos os serviços e reforcei que eles teriam exatamente uma semana para finalizar o trabalho, conforme o combinado. Voltei andando pelas ruas peculiares de Addis, obras e poças por todos os lados. O centro tem um charme particular e energia positiva, mesmo com as dificuldades evidentes.

Graças ao gentil convite da Ethiopian Airlines, voaria no dia seguinte para Gondar e depois a Lalibela. Uma oportuna viagem para fora de Addis durante a recuperação da Freelander, permitindo-me fugir um pouco das estradas e também reavaliar o turismo mais convencional na Etiópia, em duas das suas principais atrações.

Na volta para Addis, uma semana depois, fui direto do aeroporto à oficina. Grata surpresa quando me disseram que estava tudo pronto: acertei a conta e estava novamente dirigindo no trânsito maluco. Mas senti que algo estava estranho e a temperatura do motor começou a subir. Muito irritado, voltei à oficina e perguntei se não haviam testado o veículo durante a semana. Detalhe: o resfriador do óleo do motor, trocado em Dodoma por um usado, foi novamente trocado por um novinho em folha. Não poderia ser esse o problema.

Nos próximos 3 dias, o mesmo ritual: chegava na oficina no fim de tarde, ouvia que estava tudo bem, saia feliz da vida e voltava na manhã seguinte com a temperatura alta. Até que detectei uma fissura no reservatório de água do radiador, ignorada por toda a equipe de mecânicos. “Trocamos em dez minutos, mas a peça chega em uma semana da Europa” – proclamou o sr. Lemma Kebede, chefe da oficina, com um sorriso amarelo.

Transtornado, comprei uma fita adesiva e passei várias vezes no tal reservatório, de raiva. No fundo, eu sabia que não ia funcionar. Mas depois do elaborado reparo, como um milagre, a temperatura parou de subir. Testei por um dia inteiro a eficiência da fita, dirigindo no agradável trânsito de Addis, e o motor não aqueceu mais. Comprei mais fita, agradeci a todos os infinitos santos etíopes e decidi seguir viagem no dia seguinte.

Cansado, fortemente gripado e com uma preguiça enorme de dirigir até a esquina do hotel, fui dormir realizando que tinha que sair de Addis Abeba e chegar em Cape Town.

Começava uma nova travessia, agora rumo ao sul.

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A Etiópia é um dos países mais interessantes e complexos da África. Diferentes critérios geográficos, históricos, étnicos, tentam classificar os países africanos, mas a Etiópia não se enquadra em nenhum deles. É um universo à parte, com enorme potencial turístico, mas sua infraestrutura sempre deixou a desejar.

Muitos fatores começaram uma intensa transformação no país, notadamente a parceria estratégica com o governo chinês, trazendo investimento em infraestrutura e um aumento da relevância diplomática e militar da Etiópia no contexto africano. O aumento da atividade industrial e obras de grande porte, como a Grande Barragem do Renascimento, levaram a Etiópia a apresentar a maior taxa de crescimento da África.



A consolidação da Ethiopian Airlines e de seu hub em Addis Abeba também contribuiram para colocar a nação sem saída ao mar definitivamente no mapa turístico internacional. A Ethiopian começou a voar para o Brasil em 2013. Mesmo com limitações na rede hoteleira e nos transportes, são muitas as atrações na Etiópia. Os destinos principais são Gondar e Lalibela, mas além de Addis, as cidades de Axum e Bahir Dar marcam presença nos roteiros pelo país. O Simien Mountains National Park é a principal atração de natureza. A culinária etíope, baseada na injera, um crepe de farinha de teff fermentado em água, é uma atração à parte. Os wots são os acompanhamentos típicos.



Gondar, no noroeste da Etiópia, está em uma crista basáltica a 2.300 metros de altitude, de onde os rios que cortam a cidade fluem para o Lago Tana, 34 km ao sul, na origem do Nilo Azul. Capital da Etiópia de 1632 a 1855, é a guardiã de castelos e palácios construídos por uma série de imperadores, de Fasilides (1632 a 1667) a Iyasu II (1730 a 1755). As ruínas dessas estruturas ficam dentro da cidade imperial, protegida por muralhas. Os edifícios mais importantes são o castelo de Fasilides e o palácio de Iyasu, o Grande (1682 a 1706).

O estilo arquitetônico desses edifícios de pedra exibe influências portuguesas, referências aos palácios do império Aksumite e às mesquitas do sul da Arábia. Poucas das 44 igrejas que iluminavam Gondar no século XVIII ainda existem, mas a cidade manteve a posição de destaque na estrutura da Igreja Ortodoxa Etíope; destaque para a Igreja Debre Berhan Selassie (século XVII), ainda ativa. Gondar sofreu muito durante o período das guerras civis (1750-1890) na Etiópia, mas após a conquista britânica do Sudão (1899), a cidade retomou seu comércio com a região do Nilo Azul.

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Lalībela é um centro religioso e de peregrinação, no centro-norte da Etiópia. Roha, o nome antigo da capital da dinastia Zagwe por cerca de 300 anos, foi renomeada em homenagem ao seu monarca mais ilustre, Lalībela (1162-1221), que segundo a tradição, construiu as 11 igrejas monolíticas. Designadas como Patrimônio Mundial da UNESCO em 1978, foram escavadas em rocha sólida (inteiramente abaixo do nível do solo) em uma variedade de estilos. Geralmente, as trincheiras eram escavadas em retângulo, isolando um bloco sólido de granito, que era então esculpido tanto externa quanto internamente, de cima para baixo. A mais famosa delas é a igreja de Saint George (Bete Giyorgis).



As igrejas estão dispostas em dois grupos principais, conectados por passagens subterrâneas. O imperador Lalībela construiu as igrejas em sua capital, Roha, na esperança de substituir a antiga Aksum (Axum) como a principal cidade etíope. As igrejas atraem milhares de peregrinos durante as celebrações nos dias santos e são atendidas por padres da Igreja Ortodoxa Etíope de Tewahedo. A cidade também serve como um centro mercantil para o povo Amhara.

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Agradecemos nesta etapa a Ethiopian Airlines.

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Gostou? Este post faz parte do projeto Agulhas – Alexandria, a travessia completa da África do Sul ao Egito, planejada e executada pela Atlantic Connection Travel. Conheça a história completa:
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Administrador de empresas (FGV), fundador da Atlantic Connection Travel (1996) e da ACT Afrika Tours & Safaris, operadoras de viagem especializadas em África e Ilhas do Índico, com sedes em São Paulo, Cape Town e Odessa.

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